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quarta-feira, 27 de junho de 2012
segunda-feira, 25 de junho de 2012
agora
que cada vez mais
este
eu se imprime
febril
e lúcido
na
metrópole cheia de gente
esvazio-me
de certeza
a
tinta mingua e o sangue coalha
na
cova
para
a cova
somos
um covil de vermes
cemitério
infinito em expansão
sobrelotado adiado e extinto
in Meditações Sobre o Fim - Os Últimos Poemas, edição Hariemuj, Junho 2012
quinta-feira, 14 de junho de 2012
Soy un puto resentido y un puto inadaptado.
Soy un puto actor que hace de perro,
por una puta vez en su puta vida,
[…] porque un perro cobra más que un puto actor.
Angélica Liddell – Perro
Muerto in Tintorería: Los Fuertes
1.
Calypso
Eu sou Calypso,
sou a actriz que faz de Calypso.
Sou a protagonista
paga para ser a outra,
escolhida e vestida de puta.
Seleccionada pela cara e pelas mamas,
– reparem no decote babado por velhos de ténis
brancos.
O meu currículo foi lido na diagonal,
na horizontal
e é sempre surpreendente o efeito da contracção do
diafragma.
Eu sou a deusa da minha classe,
tenho prémios e faço cinema. Sou imortal.
Vivo na merda de uma ilha,
e toda a gente sabe que os habitantes das ilhas não
passam de prisoneiros na sua própria terra
e toda a gente sabe que o planeta é todo ele uma
ilha,
rodeado do espaço todo, e toda a merda do universo,
mais o infinito em expansão, não passam eles próprios
de uma ilha também.
Eu sou a actriz que hipnotiza os espectadores com o
meu corpo HD,
e no Teatro sou pernas e rabo em 3D sem precisarem
dos óculos.
Sou barata.
Sou cara.
Depende.
Faço-me pagar consoante o conteúdo,
se não me agrada faço-me cara.
Como as putas.
Eu sou a boca da Calipso,
eu sou o final da boca da Calipso.
A actriz que decorou as deixas, mas não entendeu o
fim.
Eu estou abaixo das cadelas.
Sempre cheia de cio.
Sou uma cadela com cio.
Sou a actriz que faz de cadela com cio.
Sou exótica.
Sou estúpida.
Estou no final da cadeia alimentar.
Sou mulher.
in Colapso, publicações Teatro Nacional São João, 2011.
domingo, 10 de junho de 2012
FILHO –
Paizinho:
escrevo-te, apesar de saber que não irás lê-lo.
Nunca foste dado às tecnologias, nem relógio usas.
Dizes que te faz alergia ao pulso e à cabeça.
Na verdade, nunca te vi agarrado a nada que não fosse concreto, palpável,
tirando esse silêncio a que te agarras a maior parte das vezes.
Acho que a quietude é a única coisa imaterial que reconheces,
todas as outras coisas invisíveis te passam ao lado.
Ainda voltando à escrita,
ensinaste-me a segurar na caneta aos quatro anos para fazer bonecos,
e aos cinco a reproduzir palavras no papel.
A primeira delas foi
PARAR
era o que aparecia nos autocarros num néon intermitente
PARAR
decorei as letras - e essa foi a parte mais fácil – difícil foi memorizar a ordem das letras, para quem não sabe ler é uma coisa muito complicada. Sabes, sempre associei as palavras e as letras a ti. Foi ao teu lado que, aos sete anos, li o primeiro livro de enfiada: Tom Sayer, 200 páginas a letra miúda, numa edição do Círculo de Leitores. Na nossa casa só se comprava livros que viessem no catálogo do Círculo e o critério de escolha era bastante rigoroso: só os mais baratos.
Nunca foste dado às tecnologias, nem relógio usas.
Dizes que te faz alergia ao pulso e à cabeça.
Na verdade, nunca te vi agarrado a nada que não fosse concreto, palpável,
tirando esse silêncio a que te agarras a maior parte das vezes.
Acho que a quietude é a única coisa imaterial que reconheces,
todas as outras coisas invisíveis te passam ao lado.
Ainda voltando à escrita,
ensinaste-me a segurar na caneta aos quatro anos para fazer bonecos,
e aos cinco a reproduzir palavras no papel.
A primeira delas foi
PARAR
era o que aparecia nos autocarros num néon intermitente
PARAR
decorei as letras - e essa foi a parte mais fácil – difícil foi memorizar a ordem das letras, para quem não sabe ler é uma coisa muito complicada. Sabes, sempre associei as palavras e as letras a ti. Foi ao teu lado que, aos sete anos, li o primeiro livro de enfiada: Tom Sayer, 200 páginas a letra miúda, numa edição do Círculo de Leitores. Na nossa casa só se comprava livros que viessem no catálogo do Círculo e o critério de escolha era bastante rigoroso: só os mais baratos.
quarta-feira, 6 de junho de 2012
(Olha em volta para as
cabines com os clientes)
Estão a apanhar? O primeiro a
agarrar a coisa, leva um Donuts™. Têm uma
caixa de Kleenex™ ao vosso lado, para o caso de começarem a suar das têmporas, o
que é perfeitamente normal, as minhas ideias normalmente aquecem a marmita. Não
sei como é que ainda não estou careca, a sério, está cientificamente provado
que um homem que pensa demasiado, arrisca-se a perder o pêlo. E pensar é
difícil como o caraças, e quem o diz não sou eu, mas o Deleuze. Não me
considero um pensador, um filósofo, enfim, um onanista do intelecto. Não passo
de um punheteiro de considerações fugazes, mas um dia, quem sabe, talvez chegue
a grandes masturbações, sem ejacular, sequer. Tornar-se-ão ideias de reserva,
só minhas, mas até lá permitam-me vir convosco. Estão a acompanhar?
in Circle Jerke
terça-feira, 5 de junho de 2012
Se
soubesse o turbilhão que vai dentro da minha cabeça, na impossibilidade de me
refrear os miolos tocando-os com os dedos, beijava-me a nuca. A minha experiência da inquietação é igual à sua. Começa por ser apenas uma indigestão de emoções,
comeu um desejo estragado e aquilo começa a azedar, horas mais tarde, no pico
do calor, que é quando as digestões se tornam difíceis. Se tiver a felicidade
de completar a digestão e passar para a fase seguinte, fica cheio de
flatulências, a vergonha em estado gasoso, e só mais tarde acabará por
livrar-se dessas putrefacções pela via das fezes. Se por outro lado, ficar
retido nesse processo digestivo, verá que se sente cada vez mais imobilizado: os
músculos, os tendões e os ossos, até ser uma nesga de pessoa e apagar-se.
Não
estou a falar da ansiedade, isso é coisa de meninas em vésperas da menstruação,
refiro-me à inquietação, àquela coisa fininha, à cárie que já atingiu o nervo. Disso pode morrer-se, acredite-me. E no mínimo, aleija.
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